Em Tetas que deram de mamar ao mundo, Lidia Lisbôa apresenta quatro esculturas têxteis confeccionadas em crochê com tiras largas de tecido trançadas à mão. Cada peça possui forma, cor e dimensão próprias, variando entre volumes arredondados e alongados que evocam seios e mamilos em escala ampliada.
As cores percorrem uma paleta contrastante: uma escultura em tons claros de bege e rosa-claro; outra em camadas intensas de vermelho, vinho e bordô, atravessadas por áreas de verde e preto; uma terceira que combina faixas vibrantes de vermelho, laranja e amarelo; e ainda uma forma suspensa em ocre e laranja queimado, cuja configuração envolvente sugere um berço. As superfícies alternam tramas compactas e densas com áreas mais soltas, de onde brotam pontas de tecido, criando texturas que sugerem pelos, raízes ou prolongamentos orgânicos. As peças são ligadas por quatro pontos ao teto do Pavilhão, e por um ponto ao chão.
As obras são fruto do gesto repetitivo e paciente do crochê, prática transmitida majoritariamente por mulheres ao longo das gerações, carregando em si memória, afeto e construção de identidade. A prática do aprendizado intergeracional construiu nossa noção de humanidade, de coletividade e de aprendizado. Ela se inscreve também no contexto da oraliteratura pela qual Conceição Evaristo advoga. No espaço expositivo, as peças impõem-se como monumentos ao cuidado e à nutrição, mas também à força coletiva inscrita no fazer manual. Aproximando-se, o visitante percebe as variações sutis de cada escultura, como se cada uma carregasse uma energia própria, compondo um gesto partilhado de resistência e acolhimento.
Elas fazem parte de uma série que Lidia desenvolve há dez anos. Para Luiza Marcolino, no catálogo da 36ª Bienal, “ao tecer histórias em vez de narrá-las linearmente, Lisbôa reverbera anseios, medos e desejos comuns, muitas vezes ocultos ou escamoteados pela sociedade. Assim, faz da costura uma escolha – uma estratégia de sobrevivência, de recuperação de si mesma e de construção de memórias.”