Para as obras expostas na 36a Bienal de São Paulo, Rebeca Carapiá debruçou-se sobre o estudo da palmeira-andante – também conhecida como paxiúba ou por seu nome científico, Socratea exorrhiza. Essa árvore, presente na bacia do rio Amazonas e na América Central, tem robustas e emaranhadas raízes aéreas que não ficam soterradas, mas expostas sobre a terra, e que, com o tempo, movimentam-se. Elas crescem em direção ao sol e à procura de água e nutrientes, enquanto as raízes que permanecem na sombra apodrecem, morrem e servem de matéria orgânica para a geração de novas tramas. Com significativa imponência visual, a árvore expande suas ramificações pelo espaço e nos instiga a pensar sobre fundações ancestrais que se transformam dinamicamente com o tempo, corporificando resiliência e fundações móveis através de intricada geometria.
Os desenhos de suas raízes também se conectam com as formas características da prática de Carapiá, que se concentra na formação e na expansão de linguagens, em que composições abstratas são feitas com cobre, ferro e solda. Suas linhas sinuosas ensaiam e perpetuam trajetos, deambulações e caminhadas, materializando a síntese de uma existência em movimento – e da própria andança como metodologia artística, epistêmica e de vida. Evidenciando diálogos usualmente negligenciados, como as percepções sensíveis, a compreensão espelhada e movimentada do presente e o domínio de materiais frequentemente atrelados à masculinidade violentadora, Carapiá enfatiza uma pulsão desejante e libertadora da criação de um corpo filosófico – ou de dotar uma entidade de corpo em pura linguagem.
A artista apresenta suas esculturas como celebrações das etapas que as formaram, desde a produção coletiva e compartilhada até a superação de desafios técnicos e de obstáculos sócio-históricos. Elas acentuam a oscilação ambivalente de, ao mesmo tempo, abrirem-se em floreios e retraírem-se na síntese formal, preencherem o espaço e incorporarem seus vazios, ensaiarem uma leveza de movimento apesar do peso matérico incontornável, ou mesmo habitarem uma zona integradora entre desenho, escultura e instalação – ou entre monumento e filigrana. Carapiá convida a compreender que não há contradição entre estar afincada no chão ancestral e alçar voo.