São muitos os fatores que nos forçam a adaptar o olhar diante da atmosfera enigmática das obras do francês Pol Taburet. A começar pelas referências sincréticas do artista, que perpassam as mitologias caribenhas, os filmes de terror e até versos de trap e hip-hop. Isso tudo inclinado sobre o plano da história da arte ocidental, resultando em uma atualização munida de jovialidade para nossa cultura visual contemporânea. Mas, além de seu repertório pessoal, difícil de ser notado de primeira, Taburet trabalha respeitando seus instintos criativos. Talvez por isso consiga nos aproximar e nos repelir ao mesmo tempo desse universo liminar que cria no calor do momento, sem receio de nos proporcionar sensações que oscilam entre medo, estranheza e curiosidade.
Seu universo é habitado por seres-espíritos de intenções misteriosas. Feitos a partir de aerografia, o acabamento de seus corpos, geralmente disformes, revela texturas hipnóticas que beiram o sobrenatural. Desfigurados, fantasmagóricos, porém humanoides, esses seres em estado de profunda mutação performam situações por vezes delirantes. O ambiente em volta parece um substrato ainda mais aterrorizante dos chamados liminal spaces [espaço liminar]. Famosos nos subgrupos da juventude cronicamente online, são lugares de transição nos quais não estabelecemos relação de pertencimento direto. No entanto, evocam sentimentos ambíguos de medo e familiaridade. Em resposta a essa demanda sentimental da geração Z, da qual o artista inclusive faz parte, suas ambientações emulam salas e corredores que só existem na liminaridade entre o que reconhecemos brevemente e o que só provém de um
lugar oculto.
Essa esplêndida combinação de fatores está em fricção com as referências ligadas à pintura ocidental, como os acenos aos trabalhos de Francis Bacon. No entanto, Taburet nunca deixa esse diálogo se perder na cronologia evolutiva da história da arte. Não se compromete, também, em representar o teor espiritual de suas obras de maneira explicativa. Ao invés disso, faz dos seus sujeitos seres de significados momentâneos, sem ceder detalhes sobre os rituais e cerimônias que parecem exercer. Nós, enquanto testemunhas, estamos condenados a tatear esse universo em busca de respostas, porém na incerteza de encontrá-las.