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6 set 2025–11 jan 2026
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Julianknxx

Julianknxx

Nathalia Grilo

 

A obra de Julianknxx não se fixa – ela se move. Seu trabalho atravessa geografias, línguas e gestos, construindo um arquivo em trânsito no qual cada voz ressoa como parte de um grande coro. Pensar seu trabalho é pensar diretamente nas raízes culturais da África Ocidental, especialmente Serra Leoa, país de origem do artista. Em filmes, instalações e performances, o artista não busca um testemunho único, mas um tecido de memórias e presenças que escapa às narrativas coloniais. Seu olhar não coleciona, mas escuta.

A noção de deslocamento é constantemente presente. O mar, as cidades portuárias, os corpos em espera ou em trânsito – todos atravessam sua obra como vestígios de um passado que nunca cessou de se movimentar. O oceano não é apenas cenário, mas personagem: um arquivo líquido que guarda traumas e possibilidades, que apaga rastros e, ao mesmo tempo, transporta-os. A Europa, em sua filosofia, não é um espaço fixo, mas uma paisagem instável, onde corpos negros reinventam o que significa pertencer.

Julianknxx se interessa tanto pela história do mundo como pela história cotidiana das pessoas que o compõem, interesse que tece o pano de fundo de sua narrativa. O coro, a palavra falada, a performance que se torna matéria – o artista entende a música como resistência, mas também como vestígio de algo maior: o som de quem nunca parou de se mover. Sua obra se inscreve na tradição oral de uma África viva e nos leva à seguinte questão: o que significa pertencer a um lugar quando os lugares são sempre atravessados por outras histórias?

A escrita de poemas é uma parte fundamental de seu processo criativo, uma ferramenta que não apenas embasa sua obra, mas a forma enquanto ele articula suas experiências e observa as realidades do mundo, transformando fragmentos de memória em novas formas de resistência. Sua prática desafia as hierarquias do arquivo ocidental, modificando a escuta em método radical e a fragmentação, em forma. O que importa não é apenas o que é dito, mas também o silêncio que alerta: o cansaço também pode ser resistência.

Julianknxx propõe uma escuta radical. Em sua obra, o passado e o presente friccionam-se, e a história não se revela como um relato estático, mas como algo que pulsa, que se refaz a cada canto. No cruzamento entre arte e política, suas imagens e sons nos lembram que nossas histórias nunca foram apenas as narrativas coloniais que nos contaram – elas também são aquilo que seguimos cantando, mesmo quando ninguém parece estar ouvindo.

Nathalia Grilo

Julianknxx (Freetown, 1987. Vive em Londres) é poeta e artista visual cuja prática transita entre a palavra escrita, a música, as artes visuais e a instalação. Em seu trabalho, explora temas como herança, perda e pertencimento, e os impactos desses elementos nas narrativas pessoais e coletivas. Com um olhar crítico sobre a história da arte e a filosofia, utiliza sua própria trajetória como prisma para desconstruir perspectivas dominantes sobre a arte, o pensamento, a história e a cultura africanas. Por meio de seus projetos, constrói um arquivo vivo das experiências da diáspora africana. Suas obras já foram apresentadas em instituições como o Utah Museum of Fine Arts (Salt Lake City), Whitechapel Gallery (Londres), Matadero Madrid e Franklin Street Works (Stamford, 2020).