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6 set 2025–11 jan 2026
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Gervane de Paula

Gervane de Paula

Mateus Nunes

 

Gervane de Paula desenvolve sua produção artística com acentuado caráter gráfico em múltiplas plataformas, como pinturas, desenhos, fotografias, instalações e objetos. Sua produção detém potente clamor ecológico, alternando entre tonalidades melancólicas e uma contundente carga denunciatória. Suas cenas de festividade em seu bairro em Cuiabá, por exemplo, complementam a realidade específica do cerrado ao também abordar com veemência os desastres socioambientais promovidos pela agropecuária latifundiária, pela mineração irregrada e pelos seus indissociáveis lastros de violência. O artista se abastece e opera uma estética pautada pelas imagens do consumo de massa e pelo uso de materiais cotidianos no Centro-Oeste do Brasil, além de recorrer a citações assertivas à história da arte. Integrante da Geração 80, De Paula esteve ao lado de artistas como Leonilson, Leda Catunda, Beatriz Milhazes e Luiz Zerbini na defesa de uma pintura vibrante e provocadora, em contraste com o hiperintelectualismo da arte conceitual brasileira dos anos 1970.

Em seus trabalhos, De Paula cria narrativas pseudoficcionais que retratam a hostilidade de latifundiários e defensores do agronegócio desenfreado quando confrontados com os questionamentos críticos da arte. Ao compreenderem os trabalhos do artista como vozes de denúncia política e ambiental que os impediriam de exercer atividades ilícitas, agem com atroz represália no cume de seus privilégios de poder. De Paula, entendendo a arte como armadilha, frequentemente retrata espingardas, artistas mortos, rios de sangue e placas que homenageiam ativistas político-ambientais, persistindo corajosamente nos poderes denunciadores e críticos da figura da pessoa que produz arte.

Além dos crimes ambientais, como os desmatamentos quilométricos, a poluição e a extinção de diversas espécies de fauna e flora, De Paula aborda a criminalidade social causada pelas dinâmicas do agronegócio, do tráfico de drogas na fronteira entre o Mato Grosso e a Bolívia, do racismo estrutural, do autoritarismo policial e da corrupção política. Em alguns momentos, de forma sarcástica, inclusive transpõe certas dinâmicas de poder e hostilidade para as relações vivenciadas no mercado de arte. O artista sempre foi vítima de um isolamento geográfico: por viver em Cuiabá, longe do eixo sudestino onde os hegemônicos agentes mercadológicos e críticos da arte operam, teve sua carreira de mais de quatro décadas por muito tempo invisibilizada e subestimada. Sua produção, entretanto, não esmoreceu, mantendo-se incessante e pungente.

Mateus Nunes

Gervane de Paula (Cuiabá, 1961. Vive e trabalha em Cuiabá) é artista autodidata. Sua produção abrange desenho, pintura, objetos e instalações, abordando questões sociais, ambientais e territoriais ligadas ao Centro-Oeste brasileiro. Participou de exposições no Art Museum of the Americas (Washington, D.C.), Bronx Museum of the Arts (Nova York), California African American Museum (Los Angeles), além do Museu de Arte de São Paulo, Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro e Pinacoteca de São Paulo. Realizou exposições individuais em cidades como Belo Horizonte, Campo Grande e São Paulo, incluindo a mostra Como é bom viver em Mato Grosso (Pinacoteca de São Paulo, 2024).

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