Moka BOB Sound System (2025) nomeia uma pesquisa sonora de Alain Padeau que resulta em um instrumento musical de caráter escultórico, produzido a partir da associação de arcos, cordas metálicas e câmaras acústicas em formato de esfera perfeita. A arquitetura geométrica do icosaedro truncado fornece ao artista a possibilidade de trabalhar a escala da câmara acústica, transformando um objeto de fatura artesanal em uma obra de arte cuja configuração e ativação evocam outros instrumentos congêneres.
O sistema de propagação do som a partir da estrutura do fio estendido nas extremidades de um arco conjugado a uma câmara acústica de formato esférico se inscreve na genealogia dos instrumentos de corda pinçada, que têm no mvett, encontrado entre os Fang, Béti e Bulu – grupos culturais de língua banta distribuídos entre o Gabão, a Guiné Equatorial e Camarões – um de seus principais predecessores. Dezenas de instrumentos similares, como o ngoni, o gurmi, o goje, o guembri, o masengo, o bolon, o kora, entre outros, variam o mesmo modelo de construção do mvett, ganhando formatos por vezes mais islâmicos – isto é, mais semelhantes ao alaúde –, mas sempre preservando na câmara acústica a função originalmente exercida pela cabaça. É desse sistema que deriva o berimbau, instrumento fundamental na prática da capoeira, arte do corpo que mistura luta, jogo e dança, combinando ritmo e agilidade dos membros, desenvolvida no Brasil por africanos escravizados e seus descendentes. Dele deriva também o bobre, instrumento utilizado na Ilha da Reunião muitas vezes para ritmar o canto, a dança e a música do maloya, gênero resultante da interação entre o patrimônio musical africano e francês, com prevalência da cultura rítmica e linguística oriunda da África Oriental. O bobre integra, portanto, um aparato diaspórico complexo, que, como a capoeira, tinha por finalidade garantir proteção e mitigar o sofrimento do corpo explorado pelo trabalho escravo.
De origem reunionense, Alain Padeau retoma os efeitos terapêuticos do bobre, não somente através de sua morfologia ancestral, remontando ao mvett africano, mas também através da imersão no mistério do som melódico e hipnotizante do instrumento de uma corda só. No uso do Moka BOB Sound System, o artista combina os princípios da corda pinçada e da corda percutida, já que a mão que normalmente sustentaria o instrumento fica livre, e o corpo do instrumento se apoia de forma autônoma em um suporte ou diretamente sobre a câmara acústica.
A prática de arpejar sobre cordas metálicas, herdada da experiência com a guitarra, intensifica o contato tátil e sonoro com a vibração das cordas. Soltas ou abafadas nesse novo instrumento, as cordas pinçadas possibilitam o trânsito da monodia à polifonia – pois instrumentos monocordes, por natureza, são monódicos. Moka BOB Sound System, assim, trabalha novas faculdades de percepção do som por meio da incorporação do imprevisto e do improviso na transformação do som em arranjo musical.