A obra de Adjani Okpu-Egbe, artista e pesquisador britânico nascido em Camarões, é multifacetada, interdisciplinar e profundamente envolvente. O artista infunde sua experiência pessoal em cores expressivas e harmônicas, simbolismos inventivos, um uso expandido de materiais e uma autenticidade enraizada em uma pesquisa rigorosa. Conhecido por sua linguagem visual estratificada e por figuras abstratas que chama de “manimals” [fusão das palavras “homem” e “animal” em inglês], Okpu-Egbe atua de forma abrangente na formação intercultural do pensamento. As três obras apresentadas como uma constelação na 36a Bienal de São Paulo marcam um momento decisivo em sua trajetória.
Com um estilo descrito pela primeira vez como “shelving” [“colocar em prateleiras”] pelo curador geral da Bienal, esses motivos expandem a técnica do artista e incorporam objetos escultóricos carregados de histórias. Eles complementam os painéis de portas – jogando com a ideia de portas “abertas” e “fechadas” em nossas vivências cotidianas – como uma metáfora poderosa daquilo que arquivamos, compartilhamos ou descartamos. A obra Fortitude (2018-2024) se posiciona contra o apagamento ao dispor, em forma de prateleira, livros escritos por mulheres negras, em especial a educadora afro-brasileira Conceição Evaristo, cujo poema “Da calma e do silêncio” inspirou o título da Bienal. Por meio desse gesto, Okpu-Egbe encarna os temas centrais do evento e propõe um cânone diversificado em lugar do repertório dominante, enganoso, patriarcal, colonial e branco.
O trabalho Premonition of Ngarbuh [Premonição de Ngarbuh] (2020-2024), produzido em resposta ao massacre de Ngarbuh ocorrido em 2020 em Camarões, confronta os horrores da violência estatal, em que mulheres e crianças são as maiores vítimas enquanto a “comunidade internacional” permanece em silêncio. Angustiante e emocionalmente contundente, a cena mostra figuras fantasmagóricas em meio a uma paisagem carbonizada – com crianças brincando de pular corda, cercadas de animais estranhos –, evocando uma sensação perturbadora de insegurança. Os objetos dispostos em prateleiras falam de perda, profanação espiritual e resiliência. Ao documentar esse trágico fracasso dos processos de descolonização e o conflito armado esquecido que assola as regiões anglófonas do país desde 2016, Okpu-Egbe ecoa Guernica (1937), de Picasso, e faz uma contribuição urgente à história da arte – um gesto que atende ao chamado por um intelectualismo público.
Exibida ao lado está a obra An Allegorical Conglomeration of Origins and Inevitabilities [Uma conglomeração alegórica de origens e inevitabilidades] (2024), baseada na imaginação de futuros negros. Sua densa estratificação – uma tapeçaria de conteúdos autobiográficos que fundamentam a prática narrativa do artista – inclui símbolos como limões em rama, tranças, relógios e lampiões. Esses elementos refletem sobre inevitabilidades projetadas para moldar o que o artista descreve como “consciência negra em futuros negros” (BCBF, na sigla em inglês).